"O mundo está melhor. Só fica horrorizado com o presente do Iraque, onde o número de vítimas é mínimo – e que logo são socorridas e anestesiadas pra que não sintam dor –, quem não sabe que os turcos mataram 1 milhão de armênios (de uma população de 3 milhões) no século XX e nunca ouviu falar na Guerra de 18 – a Grande Guerra. Os caras apodreciam nas trincheiras. E os ferimentos não eram bonitinhos como no cinema. O soldado via o companheiro a seu lado berrando aos céus sem um pedaço da cara, sem um olho. Sem socorro.
(...)
Acabo de ler um livro admirável, Wide as the Waters (Benson Bobrick; Simon & Schuster; 380 páginas). Livro impossível de ser traduzido, pois trata justamente da luta mortal, na Inglaterra, através de séculos, pra traduzir a Bíblia pro povo. Contém comparações lingüísticas de rara beleza – em inglês! A Bíblia que resultou dessas traduções influenciou definitivamente na luta entre o Papado, a Reforma, o Stablishment inglês. A Bíblia – ampla como as águas. A maior influência pra formação da língua inglesa, pra unificação da unidade nacional.
É desse admirável Livro – feito por scholars e tratando de assunto em que só entram scholars – que tiro este pequeno trecho: "Todos os historiadores católicos reconhecem as múltiplas manifestações de corrupção da Igreja medieval – parecia determinada a se autodesacreditar. Tudo podia ser obtido por dinheiro, por mais danoso que isso fosse pra própria Igreja".
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Aí é que foi a inana. Felipe, o Belo, da França, cobiçando a riqueza da Igreja, taxou pesadamente os clérigos franceses. O Papa Bonifácio resolveu enfrentá-lo, mas foi vencido, e espancado até a morte. Logo depois Clemente V, a pedido de Felipe, transferiu o papado para Avignon, na França, onde ficou sessenta anos, perdendo todo o prestígio.
Só recuperado materialmente por seu sucessor, João XXII, que criou o sistema de apaziguar os pecados com a venda de indulgências! Qualquer um com dinheiro podia pecar (agir criminosamente) com impunidade.
(...)
Também na Inglaterra os prelados possuíam imensas propriedades rurais, tinham rendas principescas, e poderes eclesiásticos e civis inacreditáveis. Anátemas terríveis eram expelidos dos púlpitos contra todos os que resistiam aos desígnios do mando. Os mais ferozes anátemas eram excomunhões "gerais", que excediam qualquer pena contra crimes capitais. Exemplo:
"Que sejam malditos pelo que comem e pelo que bebem; pelo que andam e pelo que param; quando remam e quando cavalgam; porque riem e porque choram; em casa ou no campo; na água ou em terra, em todos os lugares. Amaldiçoados sejam seus pensamentos e suas cabeças; seus olhos e seus ouvidos; suas línguas e seus lábios; seus dentes e suas gargantas; seus ombros e seus peitos; seus pés e suas pernas; suas coxas e seus bofes. E que permaneçam malditos da sola dos pés ao alto da cabeça, a não ser que reflitam no que dizem e pensam e fazem, e venham dar satisfações".
Mensalão – eu, hein?!"
domingo, julho 10, 2005
Há um artigo que recomento a todos, do Millôr Fernandes (2005), um ótimo artigo, que muito me serve para expressar boa parte das minhas idéias e para complementar o que já foi dito aqui nos últimos dias:
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