quinta-feira, julho 21, 2005

Exposição em tempos de Orkut

O Orkut pode ser observado apenas como uma excelente ferramenta para manutenção e realização do networking, termo em inglês importado que pode ser traduzido como a manutenção deliberada de relacionamentos sociais com o objetivo de tirar proveito disso no presente ou no futuro, proveito que pode ser uma indicação de recolocação, por exemplo.

Pode ser observado também como uma grande agenda de contatos pública, que desnuda o participante a partir de seus relacionamentos, a grande materialização do dito "diga-me com quem anda e lhe direi que é", o que pode ser bom ou ruim.

O mais interessante, contudo, é a forma como o Orkut tem se mostrado um espaço para gentilezas, para demonstrações de afeto entre pessoas que não tem mais ou às vezes jamais tiveram grande intimidade, um meio simples e direto para dizer que se lembrou, ou que foi lembrado pelo próprio Orkut, de determinada pessoa.

Essa afetividade pode parecer falaciosa, mentirosa, superficial, mas também há de se reconhecer que algumas vezes pode ser também verdadeira, sincera e até profunda, o que também pode ser considerado verdade na maioria dos espaços de socialização tais como a escola, o trabalho ou mesmo a família.

Com tudo isso é claro que o Orkut promove a exposição dos indivíduos e recompensa isso, pois essa exposição promove o cuidado dos outros participantes em relação aos sentimentos vivenciados, promove o debate em relação às idéias expressadas, promove a materilização da lembrança alheia, que de alheia passa a nossa em um simples scrap (palavra que permaneceu como sinônimo de recado no Orkut mesmos após sua localização - o termo que significa que o sistema se torna local, normalmente com idioma, data/hora e moeda locais).

A exposição implica em riscos, pode ser complicado ter muita gente sabendo muito sobre si, muita gente faz grande alarde sobre isso até nos jornais, quem sabe até em artigos científicos, mas são essas mesmas pessoas que normalmente condenam a vida nas grandes cidades, os relacionamentos apoiados em tecnologia e, muitas vezes, endeusam saudosamente o tempo das cidades pequenas, em que haviam verdadeiras comunidades.

É olhando para as comunidades das cidades pequenas, como nas pequenas cidades do interior, e para o Orkut que se pode perceber o quão paradoxal pode ser o Orkut, pois não são superexpostas as pessoas que moram em uma pequena cidade do interior? Não é no interior que todas as pessoas sabem de tudo de todo mundo, incluindo aspectos da vida privada?

Em cidades do interior muitas vezes a exposição exagerada foge à previsão do usuário do Orkut, mas também isso não acontece nas pequenas cidades em que a vida privada pode se tornar pública em poucos dias?

E não é exatamente essa exposição que também proporciona apoio, sustentação para a vida em comunidade? Não é justamente se perceber conhecedor, participante e de certa forma responsável pela vida de todos que forma o espírito de comunidade?

O Orkut, ao promover essa exposição, pode estar justamente levantando esse paradoxo para a vida nas grandes metrópoles, para a vida globalizada, tornando possível participar mais da vida do outro, tornando possível vivenciar suas angústias, suas dúvidas, seus pesares.

Será que o Orkut, ao favorecer a exposição entre os indivíduos, não os proporciona maior intimidade e, com isso, além de saber e expressar sentimentos, também não favorece entre os amigos uma retomada do sentimento de responsabilidade sobre a vida do outro? Um sentimento de que se precisa ajudar quando alguém precisa?

É claro que isso implica em muitas vezes invadir o privado do outro, mas não é essa, às vezes, a única maneira de se ajudar esse outro? Claro, deve-se viver também boa parte das desvantagens da convivência em uma pequena comunidade. Quem já morou, mesmo que por algum tempo, em cidade pequena, deve saber bem as possibilidades ruins da intimidade coletiva.

Não há mal sem bem e nem bem sem mal. Até agora parece que o Orkut pode ajudar as pessoas a se tornarem mais próximas que antes, a se comunicarem com mais freqüência que antes.

Se se perguntava como seriam os sistemas de telefonia móvel se apropriando de mais características dos sistemas de mensagens instantâneas (ICQ, AIM, Messenger...), tais como informar o status do contato (ocupado, ausente, não perturbe...), agora se pergunta como seriam os telefones se fossem integrados ao Orkut.

Um comentário:

Anônimo disse...

O orkut é uma janela. Este ano resolvi entrar nesta onda e não tinha uma semana que estava cadastrada começaram a surgir antigos amigos que não via há tempos. Isso me fez bem e inseguara ao mesmo tempo. Não temos onde nos esconder hoje, em todos os lugares somos encontrados, pelo celular ou pela internet. Eu percebo também que as pessoas utilizam esses meios para se esconderem dos outros. A maioria dos meus amigos por exemplo nunca diz toda a verdade a respeito deles, sempre omitem verdades e acrescentam mentiras. No meu Blog e no meu orkut por exemplo é proibido citar minha idade, meu nome, se tenho namorado, se sou casada simplesmente porque não quero me expor. Quero me comunicar mas não me expor, escrevo aquilo que realmente penso mas sem acrescentar coisas da minha vida particular. Então o orkut tem duas facetas, você pode ser encontrado mas não precisa se expor se não quiser.