quinta-feira, maio 19, 2005

Um amigo meu, que era irmão de duas amigas minhas, uma delas separada e com filhos, disse brincando certa vez que quando fosse ao casamento da outra irmã, iria com uma plaquinha: "Não aceitamos devolução". Olha que só ela e o filho haviam retornado à casa do pai e ela tinha o carro dela, trabalhava, estudava.

Agora eu fico pensando como esse meu amigo ficaria se ela além de ter voltado para a casa deles (ele ainda tinha menos que 25 à época), ela tivesse se casado de novo e o marmanjão tivesse ido morar com eles também...

Em todo caso, eu falei isso por algo que eu vi dias atrás, algo deprimente, como a infelicidade ou a felicidade forjada pode acabar com a beleza das pessoas, como aquilo que está dentro de nós toma conta do nosso exterior contra nossa própria vontade, como uma pessoa linda pode ficar assim tão feia em tão pouco tempo. Antes havia a inadequação, eu reconheço, uma jovialidade tardia, que se harmonizou em pouco tempo na representação de si, mas ao fim, era tosco, tosco a ponto de chamar a atenção de quem nada tinha a ver.

Não há como barrar o nosso interior, ele se expressa quer queiramos, quer não, não há maquiagem que resolva. Tá, eu aceito que costumam dizer que sou meio médium, que eu tenho os "canais abertos" e que eu "vejo a alma a partir dos olhos", mas o pior é que era coletivo, a feiura contaminava a todos, até aqueles que, pela idade, já estão acima do feio e do bonito, aqueles estavam malajambrados, o que a idade não mais permite.

O mais intrigante era porém nosso amigo Lord Coeur de Roche, que estava usando seu uniforme azul impecavelmente roto. Como um Lord acaba desse jeito? Tão sem brilho, tão sem graça? Será a pedra em seu peito que o faz sofrer dessa maneira? Será contagioso? Todos que toca têm seus corações endurecidos e isso os faz carregar em seus peitos um peso que não podem suportar, como um Midas com uma maldição invisível? Só não consigo atinar para a origem de tal maldição, provavelmente nunca vou saber, mas que tais efeitos são notáveis, isso são.

Agora me vem à mente a cena, eu me remeterei ao cinema, apesar da imperfeição, do final do remake de Lolita, quando o antigo amante da Lolita atende ao seu pedido por dinheiro, mas o leva pessoalmente. O contexto é falho, mas o sentimento é o mesmo, é como se estivesse assistindo ao remake de Lolita de novo agora, depois de cinco anos, nítido, e, de repente, tudo não passou de uma profecia auto-realizadora, o tempo se contrai em minha mente, dói, tenho que massagear meus cabelos enquanto escrevo, é louco e real ao mesmo tempo, como se a figura que eu imaginasse completa, fechada, ganhasse, a partir de um único instante, três dimensões.

A profecia precisava se cumprir, nosso amigo Lord Coeur de Roche tinha seu papel a desempenhar e o desempenhou de forma brilhante, salvo que a personagem do filme, embora quase irrelevante, embora também tivesse o privilégio de não conhecer o passado da sua Lô, já começava, mesmo que com certa dificuldade, a construir um futuro só deles dois, embora Lolita insistisse em trazer o passado para dentro de casa, para perto de seus filhos, os filhos eram ao menos seus...

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